quarta-feira, maio 06, 2009

Fundos comunitários e sua aplicação

O meu amigo e colega Gustavo Simões, escreveu o seguinte artigo, na sua crónica semanal, na edição de ontem do "Diário do Minho":

«Olha só para o que eu digo…»

Devemos admitir que o nosso próprio Estado aplique a velha máxima do «olha para o que eu digo, (mas) não olhes para o que eu faço»? Temos ouvido frequentemente os partidos da oposição manifestarem o seu desagrado quanto à aplicação dos fundos comunitários, criticando igualmente a falta de transparência no que diz respeito a alguns dos programas que têm sido lançados. Sem me querer imiscuir nesta problemática política e partidária, interessa-me, enquanto profissional, ver clarificados os pressupostos e as regras que conduziram à abertura dos concursos aos mais diversos incentivos (sejam eles o MODCOM, o QREN, o PRODER, ou outros). Saber, afinal, com o que contamos. O empresário precisa de conhecer as regras aplicadas.


Ao alardear um acérrimo apoio às empresas portuguesas (sobretudo às que estão com maiores dificuldades), o Governo está a criar expectativas. Positivas, diga-se. Ao colocar verbas substanciais à disposição dessas mesmas empresas, o Governo está a criar enormes expectativas. Óptimas, saliente-se. Ao conceder os apoios a que se comprometeu, o Governo está verdadeiramente a contribuir para que, muitas delas, encontrem novas saídas e novos mercados, fornecendo ferramentas e instrumentos que as capacitem de modo a que estas alcancem metas de sobrevivência. Isso cria expectativas. Expectativas fundamentais para o desenvolvimento da nossa massa crítica empresarial, que são as pequenas e as médias empresas (nunca esquecendo as demais, como é evidente).

Se todas estas expectativas fossem uma progressão linear, e, acima de tudo, se fossem cumpridas com escrúpulo, podíamos e devíamos (moralmente) elogiar o trabalho do Governo. O problema é que há o «se» – e o «se» não nos larga, por muito que queiramos e tentemos ver-nos livres dele. E este «se», em particular, tem causado sérios danos a centenas de empresas portuguesas, que, afundadas na presente conjuntura, já não sabem para onde se hão-de virar. Quando quem mais as devia auxiliar não é solícito, que fazer? Para mais, o efeito dominó que se segue só agudiza as posições que são ocupadas por outras empresas, a montante e a jusante das primeiras. Atentemos, a título de exemplo, a duas das grandes críticas que têm sido feitas:
  • Há quem acuse o Ministério da Agricultura de falta de operacionalidade na avaliação dos projectos que são submetidos através do PRODER (Programa de Desenvolvimento Rural). Embora não haja valores concretos e fidedignos, crê-se que apenas uma ínfima parte dos fundos disponíveis para este programa tenham sido aplicados, o que revela, no mínimo, um grave subaproveitamento de verbas. Este dado revela pouca ambição no que concerne a áreas cruciais para o nosso país, incluindo o sector da agricultura, uma hipótese, a ser verdadeira, que nos deve deixar a todos alarmados. Uma das justificações que têm sido dadas para a falta de agilidade deste programa prende-se com a escassez de Recursos Humanos disponíveis no Ministério da Agricultura para a avaliação dos projectos. Ora, num país que regista subidas diárias no número de desempregados, não é sequer admissível que se utilize este argumento. A subcontratação de pessoas ou a contratação de outras a tempo parcial, mormente em alturas de maior necessidade, por certo resolveria muitos desses problemas.
  • Citando agora outro exemplo, o do MODCOM (um programa de ajuda à modernização da actividade comercial), facilmente concluímos que os prazos adiantados pelos organismos competentes não estão a ser, de todo, cumpridos e respeitados. Isso traz consequências nefastas a um sem número de empresas ao longo da cadeia de serviços. Uma empresa que submeta uma candidatura ao MODCOM revela um vincado desejo de modernização. Assim, é do interesse de todos, clientes e fornecedores, que essa empresa leve por diante os seus intentos. Este é o pensamento de quem legisla e de quem coloca os fundos à disposição das empresas e dos empresários: auxiliar empresas e todos os agentes económicos que com elas se relacionem. No entanto, e como se já não bastassem os prazos de decisão muito alargados que estão previstos em incentivos como o MODCOM, o que na realidade acontece é bastante mais grave. Só para que o leitor entenda mais facilmente, há empresas que apresentaram candidaturas ao MODCOM em Julho de 2008 e só viram o parecer favorável ser publicado em meados de Novembro – o que corresponde a mais de três meses de espera. Após tanto tempo de incerteza – um conhecido inimigo das empresas –, os contratos do respectivo incentivo só foram assinados em Março – oito meses volvidos. À data de hoje, Maio, ainda não há reembolso para os investimentos previstos nesses projectos do MODCOM.

Se pensarmos na gravidade do efeito de «bola de neve» que daqui pode decorrer, considerando a empresa promotora, os seus vários fornecedores, e a empresa promotora enquanto cliente de uma outra responsável pela elaboração da candidatura, compreendemos que o imenso atraso na concessão dos incentivos pode comprometer inúmeras empresas, num encadeamento preocupante. Tudo quando a solução passaria pelo simples cumprimento de prazos. É precisamente este ponto que urge esclarecer, a bem de todos e para maior transparência no mundo dos negócios. Do que as empresas precisam é de processos céleres e eficazes, e o Governo, seja ele qual for, devia ser sempre o primeiro a dar o exemplo.

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